Consumidores da barbárie
Numa sociedade que lamentavelmente cultua a violência,
é preciso considerar uma das práticas mais contraditórias: o
consumo da barbárie e da tragédia. Os programas de maior audiência não são os
que cobram a justiça, mas os que exibem e exploram o ibope usando a tragédia. Hoje
a violência é um produto bastante lucrativo na mídia.
Diante deste cenário horroroso, o texto abaixo de
Thiago Cunha serve para meditar um pouco a respeito não da violência, mas da
forma como reagimos quando estamos expostos a ela na mídia.
Obs.: o destaque em negrito não faz parte do texto original.
Obs.: o destaque em negrito não faz parte do texto original.
Thiago Cunha
Impressiona-me
a forma como perseguimos a notícia. O furo de reportagem nos incentiva a
superar os limites da máquina e do homem. Chegamos ao local do crime. Os rostos
dos miseráveis parecem felizes com a nossa presença naquele lugar desconhecido.
Sonham sair do ostracismo pelo caminho mais trágico: a notícia da morte
violenta.
Uma cena
chocante: as pessoas sorriam enquanto rodeavam o morto. Achavam o máximo a
possibilidade de ver alguém daquele fim-de-mundo nas páginas policiais do dia
seguinte. Gritos de protesto? Nenhum. Busca por justiça? Inútil. Presente à
cena do crime, a polícia cuidava de colher dados sobre o morto: idade,
profissão, ligações com entorpecentes. Só. Entraria nas estatísticas. Dos
pobres, é claro. Jamais um inquérito bem formulado como possuem as atrocidades
cometidas contra pessoas da classe média e da classe alta. No mais, ninguém viu
nada. Nem ouviu. Ninguém desconfiava de nada e de ninguém. Não havia motivos
para que aquilo tivesse acontecido.
E eis que
a mãe da vítima, sentada no meio-fio, junto ao corpo do filho, vira-se para o
repórter, verdadeiro abutre da tragédia, e oferece-lhe uma foto do filho morto,
para que apareça no jornal do dia seguinte, no espaço destinado aos
consumidores da barbárie.
Quem será
pior? Os abutres que perseguem a morte para registrá-la ou os que ratificam a
loucura, devorando no jornal cada detalhe de um assassinato?
Ou seremos
todos, nós e eles, a serpente que devora a própria cauda?
Um abraço a todos.
Marconi
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